Boa noite leitor, a semana começou bem, apesar de já estarmos no meio dela, agora que tenho mais tempo para me dedicar as coisas que gosto, ou seja, estou desempregado (rs), mas ao mesmo tempo essa escolha está me garantindo a paz que andava faltando no meu dia, ou o tempo para ter essa paz. Enfim sem prolongar mais vamos tratar de um tema voltado à espiritualidade nórdica no que se refere a criaturas e esta semana vamos falar daqueles seres indesejados e teimosos que não ficam em paz e resolvem voltar para atrapalhar a existência dos vivos.
Seu nome é Draugr, trata-se de uma alma penada, um fantasma, alguém que após o fim do seu ciclo biológico não conseguiu prosseguir naturalmente o caminho ao qual sua alma estava destinada. As razões para que uma criatura dessas permaneça no mundo dos vivos são variadas, seja por um rito funerário inadequado, seja por uma maldição, seja ainda pela ligação com assuntos inacabados ou mal resolvidos. A sua distinção costuma ser dada pelo local de sua morte, sendo os Draugar ligados ao solo ou ligados ao mar, isso se dava pela grande quantidade de mortos em alto mar, seja pelas guerras, por doença ou ainda por azar frente as gigantes forças da natureza.
O Draugr nãos e confunde com o espírito, mas é um corpo que fica para trás, portador das memórias e desejos e impulsos que moviam o espírito, uma alma "leve" dificilmente poderia ficar ancorada em tal cadáver e uma alma "carregada" com certeza dava toda a sorte para que seu cadáver pudesse permanecer entre os vivos, vindo inclusive a perturbá-los. Entre os Vikings era crença comum que o tesouro de um homem avarento seria guardado pelo seu cadáver, logo isso evitaria a violação do túmulo, mas não pelo altruísmo do cadáver em proteger o tesouro e a honra de sua alma, mas sim por ser tudo que restou ancorando o corpo sem vida ao mundo dos vivos.
As sagas contam que os Draugar tinham sua força e tamanho aumentados comparados com o corpo original, o que não é difícil de imaginar uma vez que se trata de uma criatura morta, sem terminações nervosas que possam causar cansaço ou fadiga ao corpo, a propósito não tenha o Draugr por um zumbi e sim por um fantasma e quando falo de um corpo não me refiro a carne e osso e sim ao perispírito que restou preso ao mundo dos vivos e que sempre esteve preso no corpo do dono quando vivo, como todos nós temos, a diferença é que com o falecimento do corpo físico este "segundo corpo" se desprende do material deteriorado e passa a entrar em decomposição com o tempo, dando sempre aos falecidos invocados por necromancia o aspecto pálido, doentio e cadavérico, mas isso é outro assunto.
Entretanto há um detalhe curioso, Thorolf da Eyrbyggja Saga era descrito como muito pesado, inchado como um boi de olhar pouco apreciável, o que me leva a crer que seu peso poderia se manifestar pela vontade do Draugr, mas ainda não se tratava de um corpo físico em si, e sim uma percepção sensorial do narrador da Saga. O que corrobora minha visão é a habilidade atribuída a estes seres de poder fluir pelas rochas como se pudessem mergulhar e atravessá-las, logo se o peso dele é físico não seria capaz de tal feito, sendo plausível uma variação da vibração de seu corpo tornando sua matéria mais ou menos densa.
Os métodos de um Draugr para aniquilar sua vítima vão desde a brutalidade “física”, passando pelo enlouquecimento da vítima pela influência do morto-vivo, até comer a carne e beber o sangue de sua vítima. A aura de entropia poderia ser tão forte que animais pequenos poderiam morrer na presença de um Draugr, a exemplo de Thorolf que de sua tumba matava os pássaros que voavam sobre ela apenas por sua mera presença, afinal a vida (agora artificial) ainda busca sua energia de alguma forma para sobreviver.
Dentre os relatos de poderes (trollskap) nas Sagas dos Draugr temos mudança de forma (normalmente uma foca, um boi esfolado, um cavalo cinza com uma pata quebrada, sem orelhas e rabo, ou ainda um gato que com seu peso dormia sobre o peito da vítima matando-a asfixiada); controle climático e até previsão do futuro. O Draugr Thrain se metamorfoseou em uma criatura felina (kattakyn) na Hromundar Saga Greipssonar.
Nos relatos fala-se da dificuldade em matar tal criatura, sendo por vezes até imune a armas. Recorria-se a um herói que fosse valente o suficiente para enfrenta tal criatura, então normalmente a cabeça dela era cortada, o corpo queimado e as cinzas jogadas no mar. Mas este era um método de remediar o mal e não de prevenir.
As formas de prevenção tinham como objetivo imobilizar o cadáver que por alguma razão desconfiassem que pudesse voltar como um Draugr, por meio de um par de tesouras de ferro cravadas ao peito do defunto e palhas e galhos eram colocados entre as suas roupas e nas solas de seu calçado para impedir o mesmo de se mover. Outra tradição que visava confundir o Draugr era levantar de deitar o caixão três vezes em três direções diferentes, para que caso levantasse o mesmo estivesse confuso e perdido.
O método mais eficaz de prevenir o retorno de um Draugr era uma passagem para o cadáver (corpse-door) na qual ele era colocado e após era lacrado com tijolos impedindo que o mesmo retornasse, a crença era a de que os Draugar só entram por passagens pelas quais já passaram anteriormente, neste caso sendo uma passagem involuntária, ele não poderia retornar. Essa crença provavelmente se iniciou pela Dinamarca e se espalhou pelos países nórdicos.
Na Eyrbyggja Saga os Draugar que estavam infestando a casa do islandês Kiartan foram dirigidos até uma passagem (doom-door), que funcionava como uma pequena corte, onde um a um eram convocados e eram sentenciados e obrigados a deixar o lar por meio deste método legal. Então a casa era purificada com água benta para certificar que não haveria retorno.
Como podem observar já se trata de uma influência cristã no caso da água benta, mas posso afirmar pelo que venho estudando de Galdr (magia) que a passagem e o julgamento são muito mais que mera tradição e tenham a sabedoria de não tomarem de forma literária as palavras aqui colocadas ou pouca coisa fará sentido, aos mais estudados já sabem como derrotar o inimigo.
Bom fica a dica.
- Heiðinn Hjarta
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